SOCIEDADE
Governo quer aval da AR para “meter-se” na gestão das associações em Moçambique
Conheça os pontos de discórdia da sociedade civil da proposta de lei das organizações sem fins lucrativos depositada na Assembleia de República em Outubro de 2022
O Governo moçambicano aprovou e submeteu à Assembleia da República, em Outubro de 2022, uma proposta de lei para estabelecer o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das organizações sem fins lucrativos, sem qualquer participação dos interessados.
O executivo alega que pretende impor disciplina, controlar práticas inadequadas e prevenir o financiamento ao terrorismo. Contestada por um movimento de cidadãos e associações, a referida lei atribui poderes excessivos e discricionários ao Governo de reconhecer, controlar o funcionamento e extinguir as associações/organizações da sociedade civil, impor regras e exigências exageradas às associações e seus membros.
De 6 à 16 de Fevereiro corrente, deputados da 1a Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e Legalidade da Assembleia da República realizaram, à escala nacional, uma série de reuniões de auscultação, as quais contaram com uma massiva participação de cidadãos e associações. Em Nampula, a reunião teve lugar na Assembleia Provincial de Nampula.
Na abertura da mesma, a deputada Margarida Machava, que chefiou a Comissão de auscultação em Nampula, explicou aos presentes que a proposta de lei que estabelecer o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das organizações sem fins lucrativos foi aprovada pelo Conselho de Ministros e submetida à Assembleia da República pelo Governo e tem em vista combater o financiamento ao terrorismo e branqueamento de capitais.
“Desde 2017, o nosso país é alvo de actos terroristas, e esta proposta de lei visa combater estes problemas” disse a deputada, perante várias organizações da Sociedade Civil.
Segundo o debate havido durante a auscultação pública, amplamente divulgada nas redes sociais de diferentes organizações da sociedade civil, os problemas da proposta de lei prendem-se com o facto de, no acto da sua elaboração, não terem sido envolvidos os cidadãos e as associações.
As Organizações da Sociedade Civil (OSC) entendem que a efectivação do Estado de Direito Democrático resulta, também, do respeito e materialização da participação pública nos processos de tomada de decisão, sobretudo quando afectam os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos, como é o caso da liberdade de associação e o exercício da cidadania, conforme plasmado no artigo 3 da Constituição da República.
A outra problemática tem a ver com a denominação “proposta de lei das organizações sem fins lucrativos”, que a OSC acha-a sem dignidade constitucional. As várias intervenções surgidasdurante a auscultação, a denominação “sem fins lucrativos” não tem reconhecimento e garantia constitucionais, pois no código civil e na constituição da República de Moçambique só estão previstas associações e organizações sociais.
Na mesma proposta delei das organizações sem fins lucrativos, à excepção do registo criminal, o processo de constituição de organizações continua complexo, oneroso e sujeito à discrição das instituições de reconhecimento consideram os cidadãos e associações, por isso pedem para que o registo de OSC seja através da Conservatória de Registo de Entidades Legais e que a intervenção do Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos se restrinja à aferição da viabilidade dos fins da associação requerente de reconhecimento para atribuição de personalidade jurídica; sejam definidos prazos máximos para resposta à processos de constituição e que caso não haja resposta, o reconhecimento da associação seja automático; seja criado um balcão único, que funcionaria como único interlocutor dos interessados, cabendo à estrutura do Ministério da Justiça dinamizar os restantes passos (registo e publicações); seja apenas requerida a publicação da certidão de registo de entidades legais ou de um trecho dos estatutos no Boletim da República e reduzido o número exigido de membros fundadores.
Sobre a liberdade de actuação e autonomia administrativa das associações, a propostade lei das organizações sem fins lucrativos restringe a liberdade e autonomia de actuação das organizações sociais ao impor regras mais intrusivas que a própria Lei contra o Branqueamento de Capitais e financiamento ao terrorismo, ao introduzir exigências de informação onerosas e injustificadas e ao indicar que o Governo aprove, monitore e avalie as organizações.
Os cidadãos e associações disseram, também, que a proposta introduz poderes governamentais totalitários para criar, controlar, suspender e extinguir as organizações sociais e cria espaço a possíveis aproveitamentos por oficiais do Governo que não simpatizem ou não concordem com a linha de actuação de certas organizações.
A mesma proposta de lei é apontada como que estando a reduzir os poderes da Assembleia Geral das organizações sociais. Só para ilustrar, o nº2 do artigo 21 da proposta impõe que “os membros dos órgãos sociais não podem abster-se de votar nas deliberações tomadas em reuniões em que estejam presentes, e que estes são responsáveis pelos prejuízos delas decorrentes, salvo se houverem manifestado a sua discordância”.
Para além desses pontos de discórdia, a proposta de lei é considerada exagerada pelo facto de dar poderes ao Governo para controlar as verbas das organizações sociais, falta de entendimento sobre o substrato para constituição das associações ao exigir, no artigo 69, que as organizações sociais, no início da sua actividade, provem a origem do financiamento e que o incumprimento desta norma constitui fundamento para a suspensão do exercício da actividade da associação ou organização social e igualmente pretender dar poderes ao Governo de extinção de uma organização da sociedade civil.
Recorde-se que Moçambique entrou, em Outubro de 2022, na lista cinzenta do Grupo da Acção Financeira Internacional (GAFI), que coordena, mundialmente, a luta contra o branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, o que significa que está sujeito a um maior monitoramento e se comprometeu a resolver rapidamente as deficiências estratégicas identificadas dentro dos prazos acordados. Só que no lugar de cumprir com as recomendações de realizar uma avaliação de risco de financiamento ao terrorismo, de acordo com os padrões do GAFI, e usá-la como base para desenvolver um plano de divulgação, optou por propor uma lei que agora é motivo de discórdia entre o governo e as organizações da sociedade civil.
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