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OPINIÃO

Do viés Partidocrático à Democracia (Participativa)

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Embora seja consensual que os partidos políticos são um veículo para a formação da vontade política das pessoas, há que pensar e aceitar outras formas extraparlamentares de representação, de resolução de conflitos e de tomada de decisões. Neste diapasão, Forquia & Orre (2011: 49) advogam que: “o pluralismo político realiza-se não somente pelo pluralismo partidário, mas também através da existência de associações civis para diversos interesses”. Por outras palavras, é necessária uma sinergia de acções, envolvendo uma rede de instituições/organizações privadas/particulares (OSC, OCB, fundações, confissões religiosas, academias/IES, associações empresariais, órgãos de comunicação social, de administração da justiça…) rumo ao que se designa por “welfare mix” (Sociedade-providência). Até porque os latinos dizem: “nunca uno, raro duo, semper tres” (a união faz a força, unidos somos mais fortes e juntos faremos proezas).

Aliás, democracia, ultimamente, não representa cabalmente as aspirações da sociedade, devido a vários factores, entre eles: a falta de cultura democrática nos partidos políticos, onde impera a disciplina do alinhamento político-partidário; a ditadura do voto da maioria, no parlamento, onde os deputados tornam-se meras caixas de ressonância dos partidos (pois, estão “amputados” dos seus deveres de representar verdadeiramente o povo); a insignificância dos parlamentares que, vezes sem conta, só estão lá “para-lamentar” ou “para-se-alimentar”.

Dentro deste diapasão, o proeminente sociólogo português, Boaventura de Sousa Santos (2007) abona que a democracia representativa/parlamentar, ao reduzir-se ao simples facto de escolha de representantes, por meio do voto, sem a participação efectiva da sociedade, desvela lacunas, incoerências e até paradoxos, tornando imprescindível a democracia participativa e pluralista.

Diante disso, podemos dizer que a Democracia (poder do povo) representativa tornou-se uma Partidocracia (o poder dos partidos).  Esta visão, também é trazida à tona pelo jurisconsulto moçambicano, Edson Macuácua, no seu livro Riscos do Sistema Político Moçambicano (2023: 35), ao afirmar que temos “uma democracia de partidos, pois são os Partidos que concorrem à Assembleia da República, e os votos são direccionados a estes, sendo que os candidatos individualmente considerados não têm relevância. Assim, a qualidade dos Deputados a serem eleitos, a sua representatividade política e social depende de escolhas feitas pelos Partidos Políticos, que muitas vezes, podem não corresponder às expectativas dos cidadãos eleitores”. E por conta disso, continua ele, “uma vez que os Deputados não são eleitos individualmente, mas sim através dos Partidos Políticos, eles estão vinculados à disciplina partidária; não podendo ter decisões independentes, recebem orientações da chefia das Bancadas Parlamentares sobre o sentido do voto, e as chefias das Bancadas Parlamentares, por sua vez, recebem orientações das respectivas direcções dos Partidos Políticos que representam, daí que as decisões são tomadas por bancadas parlamentares, sob orientação dos Partidos Políticos”.

Sendo assim, é necessário criar uma democracia à altura do momento histórico–uma democracia participada política e economicamente, uma democracia que sai do “palácio” (parlamento) e entra na cultura de todas as pessoas, passando, assim, a ser uma democracia quotidiana e incisiva, que conjugue a representação e a participação. É com este tipo de democracia que as necessidades e iniciativas da sociedade tomam primazia, e as pessoas são tidas como sujeitos/cidadãos (e não objectos) do seu próprio destino.

Todavia, é preciso clarificar que, embora a democracia participativa seja incontornável no processo de boa governação, não significa que a representativa já não faça sentido, ou seja, excluída. Nada disso. Simplesmente, queremos dizer que é imperativo a sua combinação, pois são complementares. Esta complementaridade implica uma articulação mais profunda entre a democracia representativa (que formula/emana leis) e democracia participativa (da qual as leis devem ter a sua origem e sustentáculo). O povo deve ser, de facto, “o patrão”, como advoga o Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi. O Parlamento é, sim, necessário para emanar leis que governam a sociedade, pois “ubi societas ibi ius” (onde há sociedade deve haver leis). Todavia, essas leis devem ser fruto da vontade da sociedade e não pura e simplesmente dos partidos.  Os deputados devem ser a “vox populi” (voz do povo, da “demos”) e não a dos partidos.

Para tal, a condição sine qua non para a concretização da democracia participativa é a participação política, isto é, a participação na discussão dos problemas do país, da província, do município, do distrito… e na formulação de políticas públicas de forma livre, aberta e séria. Por outras palavras, é por meio da democracia participativa que os que não fazem parte do Parlamento, ou do Executivo, são incluídos no processo democrático, contribuindo para a formulação de políticas públicas rumo à um país de bem-estar económico, político, social…

 

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2 Comments

2 Comments

  1. Ana Costa

    Julho 23, 2024 at 10:55 am

    Frisar a cultura democrática e associar a inclusão da ética política, como um princípio regulador. Portanto, nos instrumentos políticos (legislação, regulamentos) deve-se acompanhar de ética política. Os políticos precisam desse princípio para melhor coesão política. Menos enigmas e mais valores sociais no acto de participação colectiva.

  2. Joa Sitole

    Julho 23, 2024 at 10:50 pm

    Nb

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