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OPINIÃO

Por um Moçambique de bem-estar socioeconómico e político

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O politólogo Roberto Bobbio (1996:174) afirma que, “o dever do homem de cultura (académico, intelectual’ crivo nosso) que não queira ficar indiferente ao drama do seu tempo é o de fazer explodir as contradições, desvelar os paradoxos que nos põem diante de problemas sem uma solução aparente, indicar as estradas sem saída”. É justamente isso que nos inspira, impele e ousa partilhar as nossas ideias, com rigor, neste jovem jornal RIGOR, que já completa a sua 100 edição (já tem um “século” de existência). Parabéns!
Moçambique, como país, está passando de uma dependência para a outra. Da dependência colonial, passou para a dependência ideológica (comunista), e, agora, entrou na fase da dependência financeiro-industrial. Esta nova forma de dependência põe limites estruturais ao desenvolvimento, enquanto se depende do sector da exportação e está-se sob controlo monolítico de Corporações Multinacionais com conivência ou aval de alguma elite político-económica. Em função disso, nota-se o surgimento de uma oligarquia político-económica que se impõe em detrimento do Estado; a perda de conquistas sociais; a acentuação da discrepância entre uma minoria abastada (que vive na “relva”, ou a grande e a francesa) e uma maioria indigente (que vive na “selva”, do pão que o diabo amassou), etc.
Como consequência, isto traz inúmeros desafios: a greve dos médicos e professores; a falta de medicamentos básicos nos hospitais e/ou centros de saúde; a insatisfação e possível greve dos juízes; o descontentamento e reivindicações em vários sectores da função pública; as manifestações dos antigos membros da SNASP; os livros escolares com erros crassos que até bradam os céus (para além do atraso na sua distribuição); a corrupção institucional desenfreada, manifestada através dos famosos “refrescos”, “ways”, lobbies; a perda de sentido de comunidade ou de respeito pela “Res publica”, ou Bem comum, onde os interesses particulares tomam primazia em relação interesses públicos, entre tantos outros. Portanto, o país vive, hoje, uma situação que requer uma nova abordagem, que passa por enveredar por um desenvolvimento sustentável endógeno e pela inclusão social, tendo como sustentáculo a democracia participativa.
O primeiro antídoto, o desenvolvimento endógeno sustentável, possibilita que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social, económico e de realização humana e cultural, pois este concilia a economia com o ambiente e a comunidade; considera a eficácia económica, mas também os benefícios sociais. Enfim, visa melhorar a qualidade de vida humana, procurando formas de não comprometer o ecossistema.
O segundo, a inclusão social, passa pela maior preocupação com a promoção social e económica das populações, a repartição mais equitativa dos rendimentos e a correcção dos desequilíbrios ou assimetrias regionais. O Estado, por si, não consegue dar vazão a este problema. É necessária uma sinergia de acções, envolvendo instituições privadas, rumo ao que se designa por “welfare mix” (Sociedade-providência) como consequência quer da fragilidade estatal, quer da incapacidade do mercado. A “welfare mix” dá lugar a um Estado social garante de direitos, isto é, que não é apenas prestador de serviços sociais, mas que também cria as condições necessárias para sua efectivação, através de uma vasta rede de instituições ou organizações particulares.
O terceiro, é a democracia participativa, pois democracia representativa, ao reduzir-se ao simples facto de escolha de representantes por meio do voto sem a participação efectiva da sociedade, desvela lacunas, incoerências e até paradoxos, tornando imprescindível a democracia participativa e pluralista (Santos, 2007). Enfim, a democracia representativa tornou-se uma partidocracia (o poder dos partidos, e não do povo). Para que se faça sentir a (verdadeira) democracia é imperativa a participação política, isto é, a participação em muitas manifestações e a discussão de acontecimentos políticos. Como diz o Papa Francisco, numa das suas exortações, “envolver-se na política é uma obrigação para todo cristão. Os leigos cristãos devem se envolver no mundo da política. A Política está muito desacreditada, mas eu pergunto: ‘está desacreditada por que?’. Por que os cristãos não se envolvem nela com espírito evangélico? É fácil dizer que a culpa é dos outros… Mas eu, o que estou fazendo? Isto é um dever! Trabalhar pelo bem comum é um dever cristão”.
Por outras palavras, é por meio da democracia participativa que os que são deixados à margem (os que não fazem parte Assembleia da República ou do governo) são incluídos no processo democrático, contribuindo para a definição de políticas públicas. É na democracia que se pode falar da boa governação que advoga a accountability (prestação de contas), a transparência, a responsabilidade, a justiça social… tidas condições indispensáveis para solidez social. Portanto, é preciso que cada moçambicano se assuma como sujeito/protagonista da sua história. Como afirma um antigo estadista americano, Abraham Lincoln: “Não poderás ajudar os homens de maneira permanente se fizeres por eles aquilo que eles podem e devem fazer por si próprios”.
Como vimos, e vivenciamos, se a orientação centralista/socialista–pretendendo satisfazer mais necessidades do que méritos–acabou por confiscar a liberdade e por operar uma nova forma de servidão; por sua vez, a perspectiva liberal/capitalista–tendendo privilegiar a liberdade–deixa no desamparo largas camadas da população. Impõe-se, então, o triunfo dos direitos sobre os privilégios, escapando-se aos erros de cálculo do liberalismo assim como às ilusões do socialismo. O caminho a seguir consiste na permanente invenção do social e na sua autonomização, a tal terceira-via que consta no Manifesto, livro dos filósofos moçambicanos S. Ngoenha e J. Castiano (2019).
Para terminar, em tempo de preparação dos jubileus de esperança para a Igreja Católica e dos 50 anos para Moçambique, nada melhor do que ouvir a admoestação de São Francisco de Assis: “Irmãos, até aqui, nada ou pouco fizemos. Recomecemos”. E ainda outra passagem: comece fazendo o necessário, depois o que é possível, e por fim você estará fazendo o impossível”.

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