OPINIÃO
Os Sapatos do Chefe
Januário era o primeiro a chegar na repartição. Abria as portas e ficava parado em pose formal à espera dos seus colegas. Chegavam e ele começava a examiná-los, não toda a indumentária, somente os sapatos. Ficava alegre ao ver seus ténis limpos, cabedais polidos a graxa preta, brilhante e refinada. Não interessava a marca ou género do sapato, gostasse minimamente dos calçados e ele saudava em estado frenético e elogiando:
― Estás bem sapatilha do hoje, colega! E sorria mexendo as mãos em total empolgação.
A alegria dele só terminava com a chegada do chefe, não por respeito, mas porque ele não gostava dos sapatos que o chefe usava. Januário ficava stressado só de pensar como um homem tão responsável, inteligente e com tanto poder conseguia andar sempre com os mesmos pares de sapatos. Afinal, a brancura dos pisos havia ganho uma cor amarelada como um indivíduo que perdeu contacto com a escova. Depois, dirigia-se à sua escrivaninha sem cumprimentá-lo e sentava-se a chiar porque imaginava o cheiro nauseabundo que os sapatos exalavam quando o chefe despia-se deles. Cuspia no chão e depois gritava consigo mesmo bem baixinho: “Porcooo!”.
Numa ocasião, o chefe chamou-o para sua sala. Quando Januário entrou viu que este estava descalço e deixou os sapatos de lado “deve ser por causa do chulé” pensou ele. Prendeu o ar para evitar o cheiro que saia dos sapatos. Sentaram-se e o chefe foi directo ao assunto:
― Senhor Januário, ouvi pelos colegas que o senhor não gosta de mim, existe algum motivo?
Antes de responder, Januário pensou: “bando de colegas fofoqueiros” como era possível um assunto que ele guardava a sete chaves ser divulgado de maneira tão banal?
― Não é verdade senhor. A resposta foi difícil porque este tentava ao máximo manter a integridade do seu olfacto.
― Então por que é que o senhor cumprimenta todos, menos eu?
Januário já se sentia sufocado por prender o ar. Quando liberou a traqueia admirou-se, a sala estava bem aromatizada.
― Não é que eu não goste de ti, chefe ― e foi sincero ― é por causa dos sapatos que não lhe cumprimento.
Então explicou o desdém que possuía pelos sapatos e os porquês. Então o chefe pegou-os e colocou-os sobre a mesa.
― Sabe porque sempre coloco esses sapatos, colega Januário?
― Não, colega chefe.
― Esses são os meus sapatos da sorte?
― Como assim? Puxou a cadeira para frente, curioso. Para além de sapatos, Januário amava também histórias sobre sapatos.
― Eu sou rico, e para ser rico tive de andar muito, e todas as andanças, fiz calçando estes sapatos.
― Uau! ― Admirou-se Januário olhando curiosamente para os sapatos ― estes feios?
― Sim, esses mesmos. Respondeu o chefe.
― Uau! ― Repetia embasbacado ― O senhor pode-me oferecer? ― Perguntou.
― Claro!
Então o chefe ofereceu os sapatos para ele. Este, saiu alegre e agradecendo. Desde aquele dia não o viram mais na repartição, diz-se entre os colegas que Januário, calçando os sapatos, anda até hoje à procura de riquezas assim como o chefe lhe dissera.
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